sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Ecologizar a justiça e a segurança




Os segmentos pobres da população usualmente dispõem de menos informação e capacidade de mobilização que lhes permitam opor-se à instalação, em sua vizinhança, de empreendimentos que tragam custos ambientais, riscos à saúde ou perda de qualidade de vida. Quando se mapearam os depósitos de lixo tóxico e perigoso nos Estados Unidos, verificou-se que esses sempre se localizavam próximos de comunidades de baixa renda, em geral negras e excluídas de benefícios sociais e urbanos. Tal fato não é mera coincidência: evidencia que os custos ambientais do desenvolvimento recaem com maior força sobre os segmentos sociais com menor poder de lutar por seus direitos e por melhores condições de vida. Ninguém deseja um depósito de lixo em seu quintal, mas os grupos mais pobres têm menos poder de realizar esse desejo e de defender a qualidade ambiental de seu entorno.
As comunidades ricas, econômica e politicamente mais poderosas, escolhem viver perto de parques ou de áreas naturais, com vistas e paisagens privilegiadas; quando ameaçadas por alguma iniciativa que possa contrariar seu padrão de conforto e bem-estar, reagem e lutam com os instrumentos legais, econômicos e políticos de que dispõem. Essas comunidades se tornam menos vulneráveis a serem atingidas pelos impactos ambientais negativos de uma obra ou empreendimento. Entretanto, têm aumentado os casos de minerações e empreendimentos viários e imobiliários potencialmente incômodos e degradadores do ambiente que buscam instalar-se próximos de áreas ocupadas por segmentos da elite econômica, embora indesejados por elas. Esses empreendimentos desencadeiam resistências e impulsionam a conscientização ambiental para esse extrato da população que não fora atingido tão duramente pelos impactos ambientais negativos.
A sociedade moderna convive com riscos e ameaças à segurança individual e social, provenientes de desequilíbrios ambientais. A segurança ecológica constitui tema emergente.
Além dos aspectos policiais e de violência urbana associados à marginalização social, novos riscos e ameaças à segurança pública e individual têm-se manifestado nas cidades. Insegurança e riscos potenciais pairam sobre a população urbana. Basta uma chuva forte para que se ultrapasse o limiar de risco e ocorram enchentes, com mortes, prejuízos materiais, ou desabamentos, com perdas econômicas e de vidas humanas.
As cidades vêm operando com margem mínima de segurança ambiental e suas funções são desempenhadas por um triz, com alto risco. Na ocupação clandestina do solo em áreas urbanas, nos loteamentos sem infraestrutura, em favelas situadas em locais impróprios, há riscos de enchentes, deslizamentos de encostas, riscos geológicos. O cidadão submete-se a riscos de morte ou à sua saúde, nos transportes, no abastecimento alimentar ou de água, na carência de rede de esgotos, na precariedade dos serviços de limpeza. A situação dramática das metrópoles transforma-se em tragédia, com o desequilíbrio climático que ocorre com frequência crescente.
Nesse contexto, as questões convencionais de que se ocupa a segurança pública constituem apenas a ponta visível do iceberg. Políticas abrangentes de segurança pública precisam levar em consideração o conjunto de perigos e ameaças à vida e à segurança, destacando-se, dentre eles, os riscos originados de desequilíbrios ambientais e climáticos.
Justiça e paz são aspirações humanas legítimas. Sua falta representa uma perda para a qualidade de vida.
Longe de constituir-se apenas preocupação da classe média, o ativismo ecológico apresenta forte componente social, quando explicita e luta por melhores condições de justiça ambiental e para evitar que os segmentos mais fracos, desmobilizados ou desorganizados, sejam atingidos pelos custos que lhes causam danos à saúde e à qualidade de vida. Ao reduzir desigualdades, contribui também para a segurança, a paz e a redução da violência.
Na falta de justiça social e ambiental, torna-se mais difícil alcançar a segurança e a paz. A justiça ambiental postula que todos tenham iguais oportunidades de se protegerem dos danos ambientais, com recursos equivalentes. Essas condições são muito distintas para os grupos ricos e pobres. A institucionalização de conselhos participativos e de instâncias multilaterais, nos quais os vários atores sociais e interessados estão presentes e podem manifestar sua vontade é um canal para mediar conflitos de forma não-violenta e para garantir a segurança. Tais colegiados são eficazes enquanto não são capturados pelos interesses dos segmentos sociais mais poderosos e influentes.
A gestão colegiada da política de segurança envolve as partes interessadas, governo, empresas, segmentos da sociedade civil.
Os trabalhos da polícia de defesa do meio ambiente, do corpo de bombeiros e daqueles que realizam ações de resgate, e que contam com simpatia da população, serão cada vez mais cruciais no futuro, à medida que os desequilíbrios ambientais e climáticos levarem ao aumento da frequência e intensidade de desastres. Mas esse tipo de trabalho é corretivo e reage à ocorrência de desastres. Mais importante e estratégico é desenvolver ações preventivas, de alerta precoce, proativas, de planejamento e gestão que reduzam a possibilidade de ocorrência de desastres e catástrofes e que evitem o sofrimento social.

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