quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Autointeresse e consciência ecológica

O autointeresse motiva muitas das ações humanas. Um bebê com fome tem interesse em se alimentar. O bebe chora, obtém o leite e sossega. É saciado com uma mamadeira ou o seio da mãe.
Nossos interesses motivam aquilo em que prestamos atenção e que influenciam nossos pensamentos e consciência. O interesse corporativista caracteriza-se pela defesa do autointeresse de um grupo a exemplo de uma corporação, organização empresarial ou instituição que tenha interesses específicos; ou de uma categoria profissional que queira defender seu mercado de trabalho. Guetos, enclaves, gangues, tribos autocentradas e antagônicas ao entorno também se comportam na defesa do autointeresse de um grupo em oposição aos demais. No campo das raças, o autointeresse confunde-se com o racismo. Centrado em crenças religiosas, leva ao fanatismo e à intolerância.
A defesa do autointeresse particularista se dá também a partir de um território, tais como os burgos da cidade média fortificados com muros para se defender contra os perigos e ameaças externos ou os condomínios fechados que proliferam nas metrópoles modernas e que procuram proteger seus moradores da insegurança e da violência que ocorre no meio externo. Em escala nacional, confunde-se com o chamado interesse nacional. No campo internacional, as dificuldades para se chegar a um acordo sobre o clima explicitam que cada país enxerga como sendo de seu interesse um aspecto distinto. O interesse nacional míope se sobrepõe ao interesse global da espécie. As reuniões internacionais sobre o clima tem sido termômetros que revelam a disposição ao autointeresse estreito ou ao generoso autointeresse planetário.
Num planeta interligado, onde ações num local produzem impactos distantes, cresce a consciência de que o interesse próprio confunde-se com o interesse do outro; em longo prazo e numa perspectiva planetária, são os interesses da própria vida, de sua reprodução e da expansão da consciência. Nessa escala, somos todos terráqueos e o que ocorrer ao planeta Gaia nos afetará a cada um. A perspectiva da catástrofe natural, como, por exemplo, a trazida pelas mudanças climáticas, ajuda a entender que, no limite, o autointeresse confunde-se com o interesse planetário.
O que você pensa percebe ou enxerga como sendo de seu auto interesse?
Em busca do programa que nos interessa, giramos o dial e sintonizamos na freqüência de onda de uma rádio ou zapeamos até encontrar um canal no controle remoto da TV. Quando encontramos uma programação interessante, nos habituamos a sintonizar nela, por rotina ou satisfação. Se estivermos sintonizados numa faixa, não percebemos o conteúdo das demais, apesar de sabermos que elas existem. É impossível estar sintonizado em todas as faixas ao mesmo tempo. Quando nos desinteressa ou não mais nos satisfaz, buscamos outras sintonias ou canais que despertem nosso interesse ou curiosidade.
A compreensão do que é o autointeresse varia de acordo com o modo de consciência em que se está.
O espectro da consciência tem diversos canais. Os diferentes interesses políticos e econômicos se refletem na percepção e no maior ou menor grau de consciência ecológica de cada ator.
Despertar o interesse por uma faixa de onda faz com que a consciência se sintonize e fixe a atenção nela. Há no planeta bilhões de indivíduos humanos, sintonizados em distintas faixas ou canais da consciência. A consciência é condicionada ou moldada por influências culturais, familiares, religiosas, do ambiente humano, social, natural. À medida que se amplia a consciência, passa-se a incluir outros aspectos no campo do interesse próprio. Percebe-se ou enxerga-se mais longe.
O autointeresse nos faz sintonizar a faixa da consciência. À medida que evolui do estágio egocêntrico para o etnocêntrico (o interesse do grupo racial ou social) para o mundicêntrico (o interesse planetário) ou o ecocêntrico, o campo do autointeresse se expande e torna-se mais inclusivo. (Atualmente inúmeros recursos visuais facilitam desenvolver essa perspectiva de escala a exemplo de http://www.youtube.com/watch?v=17jymDn0W6U e http://www.youtube.com/watch?v=Nspk_J9nzHk )

O autointeresse ampliado se aproxima ou identifica com o interesse ecológico. Enquanto a eco-ação focaliza o interesse da vida e de um planeta em condições de abrigá-la, a ego-ação enfatiza o interesse particularista, privado, pessoal. Quando a consciência focada no ego pessoal se amplia para a consciência ecológica, percebe-se que somos parte do ambiente e o que ocorrer com ele ocorrerá conosco.
A consciência social ajuda a avançar de um egoísmo estreito para o altruísmo da ação social. A consciência ecológica ajuda a avançar de um egoísmo míope e ignorante para uma forma mais ilustrada e esclarecida de egoísmo ou para um altruísmo que inclui as pessoas não-humanas (como os golfinhos, por exemplo). Com a consciência ecológica, a noção de autointeresse se alarga e expande. Ecologizar o interesse é uma atitude sábia para enfrentar a atual megacrise da evolução.

Um comentário:

Unknown disse...


Ótimo! Muito lúcido e atual. Escrevi um livro: A Evolução Humana em que defendo tese muito semelhante. Parabéns! Mauricio Roscoe